Texto e foto por Bruna Suptitz
No centro da Praça da Alfândega, em Porto Alegre, um painel do 21º Congresso Brasileiro de Arquitetos (CBA) lotou plateia na apresentação de três coletivos que falaram sobre “Novas práticas de intervenção urbana”, em diferentes escalas e cenários.
Na fala que mais despertou curiosidade do público, a arquiteta Carina Guedes apresentou o Projeto Arquitetura na Periferia, desenvolvido em Belo Horizonte a partir do seu mestrado, em 2013. A partir do entendimento de que é das mulheres a responsabilidade pela manutenção das casas, e proposta é oferecer assessoria técnica para que as próprias possam identificar e promover as melhorias necessárias.
"Quando não se tem acesso à moradia, não tem acesso a outros direitos, como saúde e educação. E as mulheres na periferia sentem mais isso. Moradia é mais que espaço físico construído".
O trabalho acontece em três etapas: mobilização, planejamento e acompanhamento. As interessadas que buscam o projeto são ensinadas a desenhar a planta das suas casas e, em oficinas, aprendem técnicas de construção, instalações elétricas e hidráulicas.
“Nos encontros, elas decidem como fazer a obra”, conta Carina. E as obras são viabilizadas de diferentes maneiras, seja por meio de mutirões organizados pelas próprias mulheres, com participação de pessoas da família, ou com mutirões organizados pelo próprio projeto, com pessoas das comunidades e de fora, que queriam conhecer a proposta e aprender as técnicas.
O recurso para a compra de materiais e contratação de profissionais – quando a mulher sente necessidade, é viabilizada via financiamento. “Às vezes não é falta de dinheiro, mas falta de conhecimento técnico”.
O coletivo é hoje uma ONG, formalizada em 2018. “Há um desafio de sustentabilidade financeira da assessoria técnica, de como ser remunerada. Optamos por ser empresa sem fins lucrativos para poder participar de editais, por entender que não seria do público final que viria o nosso sustento”, conta Carina.
Também é de Belo Horizonte o coletivo Micrópolis, que nasceu no meio acadêmico – a partir de um projeto de conclusão de coletivo, em que cinco estudantes e cinco professores intervieram no bairro Calafate. A ideia era “desenvolver um método para aproximar discurso (sobre o uso do espaço urbano) das pessoas”, explica Vitor Lagoeiro, um dos integrantes do grupo. Ele estava acompanhado da colega Belisa Murta.
O Micrópolis segue atuando na capital mineira e em outros lugares – com um projeto para o Museu do Ipiranga, em São Paulo – com o propósito para ampliar o debate sobre a cidade. “Esses trabalhos buscam colocar lado a lado pontos de vista que muitas vezes não são consensuais, mas são importantes para fazer emergir os conflitos sobre os espaços que a gente compartilha nas cidades. Esses conflitos nos parecem fundamentais para criar um espaço democrático de fato”, pondera Lagoeiro.
O painel teve ainda a participação de Leonardo Márquez, do coletivo TransLab.Urb, de Porto Alegre. Uma das ações do coletivo se fundou na “militância para tentar desfazer a visão de que os espaços públicos só têm chance se forem trabalhados sob a ótica do desenvolvimento econômico dessa metragem quadrada”.